2007 – Gestão da Mudança (Revista Prémio)

Gerir a mudança nas organizações implica não só gerir recursos e activos tangíveis (como o capital, as infraestruturas, etc.), mas também os activos intangíveis(como o conhecimento e a inovação). Se a gestão dos activos tangíveis é relativamente fácil, mesmo que por vezes em operações de grande complexidade, já a gestão dos activos intangíveis é por definição difícil, pois implica ter em conta um factor de incerteza: as pessoas! Sendo o ser humano uma entidade complexa e singular, a gestão de um colectivo de pessoas é sempre um exercício de aproximação a um resultado tendencialmente desejável, e nunca uma ciência exacta, pois cada indivíduo interpreta a realidade de uma forma distinta, podendo tomar decisões diferentes perante um mesmo quadro contextual.

Desta forma, a gestão da mudança nas organizações tem de ter em conta aquele que é o “denominador comum” das pessoas que compõem uma organização: a cultura. O facto de ser um “denominador comum” torna-o operacionalizável, uma vez que podemos gerir as variáveis da mudança cultural, que são essencialmente a forma como as pessoas interagem umas com as outras nas organizações.

Como Edgar Schein explicou, a cultura organizacional tem três dimensões:

i) os artefactos, ou seja, os produtos, a linguagem, as histórias, os símbolos e os lemas da organização, que se caracterizam por ser altamente visíveis e por poderem ser mudados fácil e rapidamente. Se uma empresa quiser mudar o seu logotipo, basta encomendar o rebranding a uma empresa especializada (logo, basta haver capital e capacidade de decisão);

ii) os valores partilhados, ou seja, as filosofias, as estratégias e os objectivos da organização, que se caracterizam por continuarem a ser bastante visíveis, mas mais lentos de mudar (porque mais difíceis, uma vez que implicam a partilha, que por sua vez é voluntária). Se uma empresa pretende mudar de estratégia, para tal terá de mudar a sua actuação no dia-a-dia, para que as pessoas incorporem a mudança;

iii) os pressupostos, ou seja, crenças, sentimentos, ou normas informais, que não são visíveis e são muito lentos de mudar (porque implicam uma mudança estrutural no sistema de crenças das pessoas, logo na sua estrutura cognitivo-emocional, o que é extremamente difícil e só se consegue com uma prática continuada no quotidiano organizacional). A este nível, empresas em cenários de pós-fusão defrontam muitas vezes o desafio de conciliar sistemas de crenças aparentemente antagónicos e rivais.

Para gerir um processo de mudança cultural, há duas vias possíveis: a) a via da imposição (em que o adquirente “subjuga” o adquirido), mais rápida, mas destruidora de valor a prazo; e b) a via da integração (em que se procura aproveitar o que de melhor tem cada cultura), certamente mais lenta e trabalhosa, mas potenciadora de valor acrescentado futuro, de forma sustentável, pois não destrói o património de conhecimento explícito e, sobretudo, tácito, da empresa adquirida, que só é disponibilizável à empresa adquirente se os colaboradores que o detêm o quiserem fazer voluntariamente.

Gerir a cultura pode fazer-se a vários níveis. Em primeiro lugar, ao nível das pessoas, ou seja, recrutando pessoas adequadas ao framework cultural desejado, ou criando um mix de pessoas que facilite o desenvolvimento desse framework, por via da mobilidade interna. Isto implica um forte e honesto investimento na criação de equipas equilibradas e com a “diversidade organizacional” adequada.

Também se gere a cultura ao nível dos comportamentos, ou seja, através de processos de socialização, de um modelo de liderança exemplar, de métodos de gestão participativa ou através de investimentos consequentes e integrados em formaçãoreconhecimento e recompensas. Estes métodos e ferramentas alavancam fortemente o reforço positivo das mudanças comportamentais desejadas. Todavia, têm de ser consequentes e integrados, uma vez que, por exemplo, de nada serve reconhecer positivamente o trabalho em equipa se depois o mesmo não for efectivamente recompensado e não estiver alinhado com um exemplo coerente dado pelo top management

Como corolário da gestão da mudança, o Prof. Paul Evans, do INSEAD, postulou a seguinte equação: E = Q x A, em que a eficácia da mudança (E) depende de duas variáveis. A primeira é a qualidade da solução (Q), à qual chegamos através da reflexão estratégica. A segunda é a adesão dos intervenientes (A), a qual implica vender a mudança às pessoas, através de estratégias de comunicação, participação e envolvimento. Esta segunda variável é crítica, uma vez que são as pessoas que fazem a mudança acontecer, e isso depende da sua decisão interior em participar na mesma. Porquê? Porque (todos) os indivíduos por natureza observampensam e decidem, seja qual for a posição que ocupam numa organização. E as organizações são feitas de todos os indivíduos que a compõem, por muito que a imagem da floresta nos faça por vezes esquecer o contorno de cada árvore…